home

search

Capítulo 26 - A Terceira Bruxa

  Apesar das tentativas das Bruxas da Noite de nos afastarem dos seus assuntos, eu e a Organiza??o continuámos a explorar os portais que partiam do acampamento abandonado no Gerês.

  Após mais algumas expedi??es infrutíferas, encontrámos outro local de interesse.

  Mal atravessámos o portal, demos por nós num caminho calcetado. Percebi de imediato onde nos encontrávamos: no miradouro no topo do Monte da Madalena, com o seu inconfundível panorama sobre o rio Lima e a vila de Ponte do Lima. Em crian?a, tinha ido ali muitas vezes com os meus pais comer ao restaurante lá situado.

  Este, porém, para meu desgosto, tinha sido abandonado e vandalizado. As janelas estavam todas partidas, e as portas, arrombadas. Sob a arcada na face norte amontoavam-se cadeiras e mesas de plástico cobertas de folhas e lama. Grafitos cobriam a maior parte das paredes, quer exteriores quer interiores.

  Decidimos come?ar a explorar pelo restaurante, pois parecia o local mais provável para uma das Bruxas da Noite se esconder.

  Entrámos pelo rés-do-ch?o através de uma das enormes janelas partidas que formavam uma das paredes do antigo bar do restaurante. Os espelhos atrás do balc?o estavam partidos, e restos de garrafas pejavam o local, juntamente com cadeiras e mesas de verga partidas.

  N?o havia ali nada de interesse para nós, pelo que atravessámos a porta atrás do balc?o, que prontamente descobrimos levar ao que parecia ter sido a cozinha. Entrámos mesmo a tempo de ver uma pequena sombra desaparecer para dentro do po?o do elevador de comida. Do que se tratava exatamente, n?o conseguimos perceber, e, quando os soldados de Almeida espreitaram pelo po?o do elevador, n?o viram nada, mas uma coisa era clara: tratava-se de uma das criaturas das Bruxas da Noite.

  Havia lou?a partida, panelas e sert?s espalhadas pelo ch?o. Após uma rápida busca para ver se encontrávamos algo que nos interessasse, subimos pelas escadas de servi?o. No andar de cima, encontrámos um pequeno quarto, ainda mais pequeno do que a cozinha, onde os empregados de mesa, em tempos, deviam ter preparado os pratos antes de os levar para a sala de jantar.

  Quando chegámos, ainda vimos a porta a fechar, pelo que fomos de imediato em persegui??o. Porém, mal saímos do quarto, estacámos. à nossa frente, espalhados pela sala de jantar, entre cadeiras e mesas partidas, encontrava-se mais de uma centena de criaturas, cada uma comendo a carne crua de animais autóctones àqueles montes: lebres, esquilos, pássaros, raposas e até morcegos.

  Entre os seres, havia trasgos e goblins, assim como dois semelhantes àquele que nos perseguira no Convento de Santa Clara. Contudo, a maior parte era formada por criaturas humanoides pequenas, com menos de um metro de altura, com o corpo coberto de pelo negro. Tinham um focinho que misturava características do de um c?o com o de um gato, o que levou a Organiza??o a batizarem-nos (sem grande imagina??o, temos de admitir) de g?es.

  Assim que as criaturas se aperceberam da nossa presen?a, deixaram as suas grotescas refei??es e viraram-se para nós. Almeida puxou-me para trás, e os seus homens, n?o correndo riscos, abriram fogo imediatamente.

  As automáticas dos soldados abateram vários dos seres, mas estes carregaram contra nós e eram demasiados para as balas os deterem a todos.

  Recuámos de volta para o quarto de servi?o, esperando que a porta criasse um ponto estreito que permitisse aos soldados lidar com menos criaturas de cada vez. A princípio, o plano funcionou, com goblins, trasgos e g?es a serem abatidos mal entravam no quarto. Contudo, quando chegou a vez de uma das criaturas maiores (que eu batizei de ogrons, em honra de uns monstros da série televisiva Doctor Who), a situa??o mudou. Apesar da torrente de balas que a atingia, a criatura continuou a avan?ar contra nós, mal desacelerando. Só caiu quando chegou a menos de um metro de nós e um dos soldados de Almeida soltou uma rajada contra os seus olhos, atingindo-lhe o cérebro e matando-a.

  Embora o ogron tivesse caído, o tempo que levou a abatê-lo foi suficiente para que muitas outras criaturas entrassem no quarto. Estas eram demasiadas e estavam demasiado perto para que as conseguíssemos derrubar a todas antes que se abatessem sobre nós. Como tal, Almeida ordenou que recuássemos até à outra porta e, com os soldados a disparar constantemente para, pelo menos, ganharmos algum tempo, assim fizemos.

  Stolen from its rightful author, this tale is not meant to be on Amazon; report any sightings.

  Tínhamos dado apenas alguns passos quando esta segunda porta se abriu, dando passagem a mais criaturas, encabe?adas por outro ogron.

  Com a rota de fuga mais óbvia cortada, Almeida ordenou aos seus homens que formassem um semicírculo em volta da janela mais próxima. Um deles usou a coronha da arma para partir o que restava do vidro e da arma??o. Depois, pediu a um camarada que segurasse um dos extremos da sua espingarda e usou-a para se baixar até uma altura de onde fosse seguro saltar até ao solo.

  Enquanto alguns dos soldados disparavam para atrasar as criaturas que se aproximavam, outros dois conseguiram sair e descer. Era, porém, óbvio que n?o íamos conseguir sair todos por ali antes dos esbirros das Bruxas da Noite nos alcan?arem.

  - Saia daqui! - disse-me Almeida. - Depressa!

  Sem hesitar, saí pela janela e, agarrando-me ao parapeito para conseguir baixar o máximo possível, deixei-me cair. Os soldados que saíram antes de mim apanharam-me. Depois, correram para o outro lado do edifício para atacar pela retaguarda as criaturas que amea?avam os seus companheiros.

  Eu estava desarmado, pelo que me dirigi à parte da frente do restaurante, onde tinha uma rota de fuga direta para o portal, e esperei.

  Durante vários minutos, ouvi tiros, gritos e urros vindos do interior. Depois, o silêncio regressou. O combate havia terminado. E eu só podia esperar para ver quem vencera.

  Passado algum tempo, vi algo mover-se nas sombras além da porta da cozinha. Quando o vulto emergiu, suspirei de alívio. Tratava-se de um dos soldados da Organiza??o. Vários companheiros seus surgiram logo atrás, juntamente com Almeida.

  - Já limpámos o interior - disse ele quando se aproximou. - Mas parece que n?o há nenhuma Bruxa da Noite aqui.

  - Ainda nos falta procurar num sítio - respondi eu.

  Levei Almeida e os seus homens em dire??o à pequena capela construída logo abaixo do restaurante. Do miradouro n?o era muito visível, pois árvores cobriam as suas traseiras. Eu só sabia da sua existência porque já tinha estado presente em dois casamentos realizados nela, na altura em que o restaurante estava no seu auge.

  O caminho mais direto, que envolvia descer umas escadas e atravessar um carreiro, estava impassável devido ao crescimento da vegeta??o, pelo que tivemos de usar o acesso principal. Voltámos quase até ao local onde o portal nos deixou e entrámos num caminho calcetado que passava diretamente abaixo do miradouro e nos levou até à pequena capela.

  Ao contrário do restaurante, esta n?o se encontrava vandalizada. De facto, bastaria uma dem?o de tinta para a deixar como nova.

  Subimos a escadaria até ao seu pequeno adro e tentámos espreitar para o interior pelas duas exíguas janelas da frente, mas só vimos escurid?o. Algo do outro lado bloqueava a vis?o.

  - Arrombem a porta - ordenou Almeida.

  Aos pontapés, os homens de Almeida n?o tardaram em escancarar a porta. Como o exterior, o interior parecia intacto. Bancos de madeira ainda se alinhavam dos dois lados de um estreito corredor que levava ao altar. Atrás deste, uma cruz com uma imagem de cristo pendia da parede. O único elemento estranho era uma mesa de madeira posicionada à direita do altar, à qual se sentava a figura encapuzada de uma Bruxa da Noite.

  - Vejo que ainda n?o aprenderam a ouvir o que vos dissemos - disse a criatura numa voz profunda e seca. - Talvez eu vos consiga ensinar.

  Almeida ainda tentou responder, mas a Bruxa da Noite come?ou a lan?ar um feiti?o e ignorou-o.

  - Recuem! Saiam daqui! - gritou Almeida.

  Alguns dos seus homens haviam-se antecipado e já estavam a caminho da porta. Ainda assim, ninguém conseguiu escapar. O feiti?o daquela Bruxa da Noite demorou muito menos tempo a lan?ar que o da sua camarada que havíamos encontrado nos túneis sob Valen?a.

  Uma rajada de vento soprou do altar e fechou a porta. Os primeiros soldados da Organiza??o a alcan?arem-na tentaram abri-la, mas n?o conseguiram. Iam come?ar a tentar destrui-la com as armas, quando uma segunda rajada, esta muito mais poderosa do que a primeira, nos atingiu. Como farrapos, fomos atirados contra a parede. Os bancos e parte das decora??es atingiram-nos em seguida. N?o fosse o nosso equipamento de prote??o, teríamos morrido ou, pelo menos, ficado gravemente feridos.

  O vento continuou a soprar e a esmagar-nos contra a parede. Era t?o forte, que nos impedia de cair. Cada vez tinha mais dificuldade em respirar. Por fim, quando me senti prestes a perder os sentidos, o vento cessou e caímos ao ch?o, por entre todas as pe?as de mobília que tinham sido lan?adas contra nós.

  Como seria de esperar, a Bruxa da Noite já havia desaparecido. Almeida chamou refor?os e revistou cada centímetro da capela, do restaurante e do monte circundante. Mais uma vez, todos os sinais de que a Bruxa da Noite e as suas criaturas alguma vez haviam estado ali tinham desaparecido. E continuávamos a n?o ter pistas quanto aos seus objetivos.

Recommended Popular Novels